Retrospectiva + O pequeno dicionário dos inícios
Um inventário dos favoritos de 2023 e palavras para inventar 2024
Eu havia planejado escrever uma última newletter em 2023, com uma lista dos meus favoritos do ano — livros, filmes, canções etc e tal. Mas, sabe como é o fim de ano, não é mesmo? Dezembro chega nos atropelando, o tempo fica curto e qualquer tarefa torna-se cinco vezes mais exaustiva. Como os fins e os inícios se misturam no grande portal do tempo, resolvi começar 2024 com essa retrospectiva (afinal, viramos o ano com o mercúrio retrógrado, recordar é viver).
Ainda não decidi se listas de favoritos do ano são absolutamente tolas ou incrivelmente adoráveis. Talvez sejam uma tolice adorável. Esses dias vi um vídeo em que Fran Lebowitz dizia: “favoritos são para crianças”. Então, se você, como eu não se importa em cultivar alguma criancice, aqui vai minha lista de favoritos de 2023.
Livro de “ficção”: O acontecimento, Annie Ernaux
Coloquei ficção entre aspas porque O acontecimento não é propriamente uma ficção, mas um relato autobiográfico escrito como um romance. Certamente o livro que me tirou o chão em 2023, me sacudiu, me fez chorar e ficar fascinada pelo talento e pelo estilo Annie Ernaux de narrar. O acontecimento conta a história de uma mulher que dicide fazer um aborto clandestino na França. Aterrador e indispensável.
Livro de poesia: A história do leite, Mónica Ojeda
Li poucos novos livros de poesia esse ano. Em novembro, porém, a escritora equatoriana Mónica Ojeda me encantou com este belíssimo livro. É poesia, mas, ao mesmo tempo é narrativa. É brutal e cintilante. Nos poemas, ela reconta a história bíblica de Caim e Abel numa perspectiva femina. Um gostinho: “Um poema é profético como o leite, porém não pode revelar o amanhã dos eventos, mas sim o amanhã do ser”. Vrau.
Filme: Entre Mulheres, Sarah Polley
Que filme, amigos. Acompanha um grupo de mulheres, confinadas em uma colônia religiosa, que toma consiência das violências sofridas e precisa dicidir entre lutar ou fugir. Primoroso do começo ao fim, mas pesadinho. Disponível no Prime Video.
Série: A League of Their Own, Will Graham e Abbi Jacobson
Para compensar a indicação “barra pesada” no quesito filmes, uma série que foi lançada em 2022, mas que assisti no começo de 2023 e não vi sendo muito comentada. A trama acompanha a criação da primeiro time feminino de baseball norte-americano. Uma série leve, inteligente, com seus momentos de drama e comédia bem equilibrados. Gostosinha demais. Disponível no Prime Video.
Disco: Negra Ópera, Martinho da Vila
Que dizer desse disco? Finesse pura. Samba de primeira. Orgulho de ser brasileira. Só ouçam.
Canção: Musta Been a Ghost, Próxima Parada
Eu sou cadelinha de música brasileira, em geral ouço pouco os estrangeiros. Contudo, supreendentemente, uma das canções mais ouvidas no meu Spotify em 2023 foi Musta Been a Ghost, da banda californiana Próxima Parada. Uma delícia de música, para levantar o astral e ensolarar o corazón. Vale ouvir disco completo também. E pasmem, descobri essa música no Tik Tok. Minha juventude não está completamente perdida.
Hábito de autocuidado: bicicleta
E para fechar a lista completamente fora de contexto, uma das melhores coisas que fiz por mim em 2023: colocar a pedalada matinal na rotina. Pedalar regularmente me salvou em muitos momentos neste último ano. É bom para o corpo, para a cabeça, para o espírito. Quando pedalo, sinto que a vida pode dar certo. Falhei muitas vezes, mas consegui tantas outras. Exercício físico deve figurar em 9 de 10 listas de metas de ano novo. Mas vale a pena realizar, galera.
Pequeno dicionário dos inícios
Eu sou adepta da ideia de que a linguagem não apenas descreve o mundo, mas produz mundos. Bom, acho que isso é, propriamente, o que me faz escrever. A linguagem inaugura possibilidades de ser. Nem sempre na palavra cabe tudo. O mundo é vasto, nosso alfabeto limitado. E, talvez por isso, eu escreva poesia, para tentar expandir as palavras de modo a caber o que não cabe na linguagem cartesiana.
Para abrir os textos e exercícios poéticos de 2024, hoje comecei um pequeno dicionário dos inícios. O que está contido e (in)contido nas palavras que usamos para dizer: começar?
Dar a largada: abandonar as promessas.
Partir: deixar os lugares onde somos inteiros. e só.
Caminhar: perder e recuperar o chão a todo instante.
Se quiser, deixe aqui nos comentários, uma palavra que te lembre “início” e a gente continua esse pequeno dicionário dos inícios colaborativamente. Compilando paralavras e significados para inventar 2024.
Coragem, fé e serenidade para nós.
Até breve,
Ana Beatriz
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